Unicesumar
Unicesumar

Missão UniCesumar no Haiti: Dia 4 - Calor

Por Lissânder D. do Amaral

Porto Príncipe (Haiti), 7 de agosto de 2019 - Dia 4

Hoje saímos mais tarde para as visitas. Já era quase 11 da manhã quando seguimos para o orfanato Lizon. Imagine um lugar grande com quartos, cozinha, banheiros, refeitório... tudo espaçoso, mas inutilizado. Antes do terremoto de 2010, o orfanato consistia em um espaço muito menor, que foi totalmente destruído pela tragédia. No entanto, um inglês de bom coração visitou o local e resolveu reconstruí-lo. Não somente reconstruí-lo, mas fazer algo novo, maior, com mais condições para abrigar as crianças órfãs. O problema é que, após a construção e inauguração do orfanato, os proprietários não souberam aproveitá-lo e, com o tempo, e sem aplicação de recursos no projeto, o prédio tornou-se quase que um “elefante branco”, não fossem as quase 40 crianças que ainda moram lá. Mas a verdade é que não há energia elétrica e, com telhados de zinco, o calor é infernal. Atualmente, a proprietária do Lizon mora nos Estados Unidos, e as crianças passam dificuldades, sem comida, sem cuidadores e sem estrutura necessária para viver. A missionária brasileira Ana Lúcia é quem tem buscado recursos e donativos para que as crianças não percam a chance de sobreviver.

Há 800 orfanatos no Haiti, mas apenas 50 deles são legalizados pelo Governo. Isso mostra a precariedade da fiscalização e o risco de muitos aproveitadores lucrarem em torno da miséria infantil.

 

Temperatura alta

No meio da apresentação do palhaço Pé-de-Chinelo no pátio descoberto, eu verifiquei a temperatura de 34 graus, mas a sensação era de um calor bem maior, pelo menos 40. O palhaço ficou todo molhado de suor e o restante da equipe sentiu bastante o desconforto.

Hoje a rotina foi diferente. Como saímos tarde de casa, e visitamos um único orfanato, não houve tempo para almoçarmos ou lancharmos durante o dia. Isso só foi acontecer à noite, quando voltamos. Por outro lado, foi bom ter mais tempo com as crianças, proporcionando mais condições no atendimento médico, nos exames oftalmológicos e nas brincadeiras.

No Lizon as crianças comem apenas uma vez por dia. Quando as encontramos, estavam famintas. Resolvemos então distribuir o lanche logo após a apresentação teatral, enquanto a cozinheira do orfanato ainda estava preparando a refeição diária. Aqui a fome tem pressa.

A médica Graciele foi chamada para examinar, com urgência, um menino apático e doente. Após alguns minutos, ela já deu diagnóstico: anemia. Ele precisava comer e beber água.

Assim como em todos os outros orfanatos, as crianças do Lizon agarraram-se nos braços de cada um de nós. A cena que se repete todos os dias, mais uma vez ocorreu. A carência emocional é gritante e mostra como as crianças percebem a oportunidade que têm, aqui e agora, de um afeto individual. Elas não sabem nossos nomes, nem quando iremos embora ou se voltaremos um dia. Mas não detêm a atenção a essas perguntas mais difíceis. Somente querem desfrutar da nossa presença, e isso elas fazem muito bem. Tanto as alegres quanto as tristes conseguem conquistar a simpatia dos visitantes, que, por sua vez, não escondem as lágrimas e o carinho por elas.

O suor se mistura com o cansaço, e torna a situação física extenuante. O nosso líder Weslley chega com água gelada e rapidamente enchemos as garrafas de cada um da equipe, o que trouxe alívio diante da sede.

Os fatos e os obstáculos que experimentamos hoje inevitavelmente servem como ilustrações para princípios mais profundos: o lado cruel da pobreza não é apenas a falta de recursos financeiros, mas o abandono; o calor humano é tão aliviador quanto a água para o sedento; a empatia quebra barreiras e conecta emoções.

Nos despedimos das crianças e entramos rapidamente na van por conta do frescor dentro do veículo gerado pelo ar condicionado. Voltamos casa, pensando nos contrastes que estão experimentando nessa semana. Mesmo que estejamos nos dedicando com amor a cada criança, é óbvio que temos opções na vida; mas elas não. As opções das crianças órfãs do Lizon ainda não estão disponíveis facilmente. Elas precisam de ajuda (física, emocional, espiritual, econômica, educacional). Nossa equipe pôde aliviar um pouco o dia delas, com comida, recreação, atendimento oftalmológico e clínica geral, mas sabemos que elas precisam mesmo é de oportunidades. Oportunidades para escolherem entre o calor voluntário do serviço ao próximo e o frescor de um ar condicionado; oportunidades entre estudar Direito ou Medicina; oportunidades entre morar no Haiti ou no Brasil.

Que bom que o calor que experimentamos hoje é só uma parte de um contexto maior de amor e solidariedade que médicos e estudantes de Medicina da UniCesumar puderam proporcionar a crianças carentes. Que elas possam ter a chance de viver com mais dignidade e com a sensação de bem-estar, como a brisa suave de uma tarde de outono.

Últimas notícias

Categorias