Em agosto de 2024, uma pesquisa da TIC Kids Online Brasil revelou que mais de 60% dos pais ou responsáveis de crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos afirmam olhar o celular dos filhos “sempre” ou “quase sempre”, para ver o que estão fazendo ou com quem estão conversando na internet.
Entre os usuários de 9 a 10 anos, a supervisão dos pais aumenta, chegando em 80%, e diminui para os usuários de 15 a 17 anos - 40%.
A pesquisa também aponta que cerca de metade dos responsáveis determina regras para a utilização de dispositivos eletrônicos (71% para os de 9 a 10 anos e 27% para os de 15 a 17 anos) e 30% suspende a utilização do celular dos filhos por algum tempo (45% para os de 9 a 10 anos e 15% entre 15 e 17 anos).
Rejane Vier, professora de Psicologia da UniCesumar, diz que o grande desafio dos pais atualmente não se concentra na extinção ou privação dos recursos tecnológicos às crianças e adolescentes, mas sim, em como trabalhar o uso das tecnologias de forma consciente e responsável, sem que os filhos se tornem dependentes. “É preciso promover a reflexão sobre os aspectos positivos e negativos relacionados ao uso das tecnologias. É imprescindível que haja a participação ativa da família na regulação do tempo e no monitoramento do conteúdo acessado pelas crianças e adolescentes”, pontua a psicóloga.
Rejane diz que o estabelecimento de regras e horários, assim como a supervisão e controle dos conteúdos acessados pelos filhos, não devem ser simplesmente impostos, mas negociados ou construídos. “As limitações do uso da tecnologia variam conforme as características de cada família. É importante que as regras sejam claras, objetivas e coerentes, e o diálogo é um dos principais mecanismos para trabalhar nessa prevenção. Muito além da imposição de regras e limites, é importante que os pais ou responsáveis apostem na comunicação, ouvindo e manifestando interesse no que os seus filhos fazem em seu tempo diante das tela”, pontua.
Em suma, a psicóloga ressalta a importância do envolvimento dos pais e do exemplo que oferecem aos filhos. Por isso, é fundamental que os pais também se desconectem das telas em alguns momentos para se conectar verdadeiramente com os filhos, participando ativamente de sua formação e promovendo o uso consciente das tecnologias por meio de diálogo e interação constantes.
Consequências psicológicas do uso precoce da tecnologia
A Organização Mundial da Saúde (OMS), determina que crianças abaixo de 2 anos de idade não devem ter acesso às telas; entre 2 e 5 anos, esse tempo deve ser limitado a até uma hora por dia; entre 6 e 10 anos, o tempo é limitado a até duas horas por dia; e entre 11 e 18 anos de idade, até três horas por dia.
Rejane faz uma menção honrosa ao Dr. Cristiano Nabuco de Abreu, psicólogo e pesquisador sobre dependência tecnológica, que revelou em um estudo recente que as crianças expostas às telas por aproximadamente 50 minutos por dia, deixam de ouvir cerca de 850 mil palavras, que seriam imprescindíveis para a formação de seu repertório.
“O estilo de vida adotado pelos adolescentes, ou até mesmo crianças hoje em dia, caracterizado pelo uso excessivo das tecnologias, não promove o avanço das habilidades cerebrais, considerado essencial nessa fase. Com um cérebro em desenvolvimento, em processo inacabado de maturação e regulação emocional, os efeitos da exposição às mídias, embora possam estimular habilidades como a agilidade cognitiva, foco, rápida tomada de decisão e a capacidade de multitarefa, não asseguram a qualidade no funcionamento mental”, ressalta Rejane.
Segundo a psicóloga, a inserção precoce de crianças e adolescentes nas redes sociais, por exemplo, podem resultar na dificuldade em interações sociais reais. Esses indivíduos demonstram fascínio pelos benefícios proporcionados pelas redes sociais, que são, principalmente, o número de pessoas que podem atingir e a possibilidade de ampliar cada vez mais a rede de amigos, mesmo que esses sejam apenas virtuais.
“Entre os adolescentes, há uma necessidade constante de aprovação no ambiente virtual, a partir de likes e comentários. Quando não ocorre como esperado, gera frustração e, futuramente, problemas de auto estima, confiança e a busca pela perfeição fora da realidade, mas amplamente propagado nas redes”, pontua Rejane.