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Avanços e aplicação das células-tronco foram abordados no encerramento do Congresso de Saúde


O 2º Congresso Inter- disciplinar de Saúde do Cesumar foi encerrado ontem (31), depois de abordar durante três dias temas abrangentes e distintos como tecnologia, comunicação e humanização da saúde, bioética, células-tronco e trangênicos, entre outros. "Os avanços e aplicabilidade das células-tronco" foi uma das palestras do último dia. Para falar sobre o assunto, esteve presente a médica imuno- logista Elenice Defunne, professora da UNESP de Botucatu, referência nacional em pesquisas neste tipo de tratamento. Confira abaixo a entrevista concedida pela médica.


Como estão os seus estudos com células-tronco?
Elenice Defunne - Realizo estudos junto com uma equipe há oito anos no Laboratório de Engenharia Celular da UNESP. Estudamos as células-tronco adultas, avaliando a capacidade delas se diferenciarem nos mais diferentes tecidos, e não trabalhamos com células embrionárias. Estas são capazes de se diferenciarem em qualquer tecido do organismo à exceção da placenta que precisa de condições muito próprias não conseguidas ainda em laboratório. A célula-tronco adulta não tem a mesma capacidade da célula-tronco embrionária, mas é capaz de se diferenciar numa dezena de tecidos, como osso, cartilagem, tecido adiposo, pele, músculo, músculo cardíaco, neurônios e outros. Em nosso laboratório, trabalhamos com a diferenciação de células-tronco adultas em cartilagem e osso e estamos iniciando em pele, tecido adiposo e neuronal. Todos com aplicabilidade prática, ou seja, aplicabilidade em medicina reparativa.


Pelo mundo como estão os avanços nesta área?
Elenice - No mundo todo inúmeros são os trabalhos que já mostram a aplicabilidade das células-tronco. Tem um muito próximo de todos nós e que as pessoas não percebem. É o uso da célula-tronco adulta no transplante de medula óssea, tratamento já feito há 50 anos.  Quando eu faço um transplante de medula óssea eu transplanto célula tronco hematoporética. Mas hoje, além do transplante de medula, nós temos regeneração de coração, seja enfartado ou em paciente com doença de chagas, tanto no Brasil quanto no exterior. Nós temos o auto-transplante de cartilagem, uma terapêutica que beneficia pessoas lesionadas, principalmente atletas, na recuperação de joelhos, cotovelos e tornozelos. Antes esse tratamento exigia grandes incisões, hoje basta apenas uma injeção, em que o médico injeta a célula-tronco da medula óssea transformada em cartilagem.


A grande expectativa é quanto ao tratamento de doenças crônicas, como diabetes, Parkinson e Mal de Alzheimer. O que já existe de concreto?
Elenice - Na área específica de diabetes existem trabalhos com resultados maravilhosos. Só tem um senão, os resultados não são duradouros. Ou seja, a célula-tronco que foi reprogramada para reproduzir a insulina que o organismo deixou de produzir, apresenta cura em 75% dos casos nos primeiros doze meses. Nos primeiros 24 meses esse índice já cai para menos de 50% e no terceiro ano pós-tratamento esse índice já está beirando 20%. Temos ainda que saber porque aquilo que nós ousamos ensinar à célula dentro do laboratório não ficou gravado num "vinchester de boa qualidade". Quanto ao Mal de Alzheimer,  as pesquisas estão um pouquinho aquém, não tão avançadas quanto os resultados com o tratamento de diabetes. Tanto em Alzheimer quanto em Parkinson, os resultados mais alvissareiros envolvem a manipulação de células-tronco embrionárias e não de células-tronco adultas. Mesmo nos países que fizeram recuperação de Parkinson, os resultados foram temporários. Trouxe uma melhora da harmonia dos movimentos durante três, quatro anos e depois novamente a doença voltou a aparecer.


Até que ponto esses tratamentos já são acessíveis à população?
Elenice - O INCOR (Instituto do Coração de São Paulo) e o Hospital da Universidade da Bahia, fazem rotineiramente a inclusão de pacientes que queiram voluntariamente fazer parte de  grupo de estudo na recuperação com células tronco, seja por isquemia do miocárdio ou por doença de chagas. Esse é um grande estudo brasileiro. Esse estudo está se tornando multicêntrico e deve atingir outras capitais brasileiras, como Curitiba, por exemplo. Mais de 150 pacientes já foram beneficiados com a terapia de células-tronco regenerando função cardíaca. Na área ortopédica, seremos efetivamente os primeiros a iniciarmos, através da cartilagem e também com a reconstituição de perdas da face como nariz, orelha e outras regiões que precisam ser reconstituídas. Em pele, o trabalho mais forte é feito na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Então, são inúmeras instituições brasileiras que estão trabalhando já com células-tronco, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.


Em sua palestra, a senhora usou o título "Células-Tronco: da polêmica à esperança". Quais as suas considerações a este respeito?
Elenice – A célula-tronco é polêmica porque envolve dois conceitos fundamentais na existência do homem: a vida e a morte. Existe uma confusão muito grande das pessoas, de que a célula-tronco poderá tornar a vida imortal. Mas não, todo pesquisador que é ético não procura a imortalidade. Esta é procurada por aqueles que têm complexo de semi-Deus e esses são prepotentes. O verdadeiro cientista é humilde e ele procura resgatar qualidade de vida e aliviar o sofrimento. Então, nós temos sim e queremos ser vendedores de esperança para que as pessoas não se deprimam na sua dor, na sua deformidade e no seu sofrimento. Mas nós temos de apontar que existem milhões de quilômetros entre a esperança e efetivamente a cura.


Qual a situação do Brasil nas pesquisas em relação a outros países?
Elenice - No Brasil, eu tenho muito orgulho de dizer que os estudos estão extremamente avançados. O Brasil tem já há algum tempo capacitação tecnológica e científica para estar de igual para igual com qualquer outro grande centro de tecnologia no mundo. O país tem apenas uma grande dificuldade, ele tem interação e ações imediatas de fundo e interesse absolutamente econômicos e uma ingerência política que atrapalha muitas vezes a lisura do processo científico. Se nós não tivermos interferência política, se tivermos ouvido científico, percepção estatística para analisar o que está acontecendo com os estudos multicentros no país e se nós não tivermos interesses políticos forçando os resultados para este ou para aquele lado, teremos condições absolutas de sermos um país de ponta na área de terapia celular.


Valdete São José e Jônatas Lucizano (aluno do 2º ano de Jornalismo do Cesumar)


Fotos: Douglas de Oliveira (aluno do 1º ano de Jornalismo do Cesumar)

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